sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Feliz 2011


Não acredito em passagens datadas. Muito menos em mudanças de comportamento por conta do final do ano. Não acredito que os sete pulinhos nas ondas do mar, as três uvas perto da meia-noite e os caroços de romã irão me trazer boa sorte. Não acredito que pular de um degrau me fará subir na vida. Não acredito que comer carne de porco irá me ajudar a seguir em frente ou simplesmente que comer peru irá atrasar qualquer oportunidade. Não acredito em superstições!

No entanto acredito que estar perto da família na virada me fará mais feliz. Acredito que a benção da minha avó trará mais luz ao meu caminho. Acredito que conversar calmamente com as pessoas que amo enquanto janto será algo bom de ser lembrado durante o novo ano. Acredito que verdadeiros amigos são melhores que o prêmio da Mega Sena. Acredito que andar na praia ajuda a esquecer os problemas. Acredito que abraço de pai e mãe elimina dores intensas.

Acredito que e-mails, torpedos e ligações diminuem distâncias. Acredito que o silêncio também é uma forma de se declarar um grande amor. Acredito que beijos inesperados são melhores que o cumprimento de expectativas. Acredito que a companhia do meu cachorro cura alguns vazios provocados por outra espécie de animal. Acredito que crescer é doloroso, mas que amadurecer é bom.

Acredito que assistir filme é uma excelente terapia. Acredito que ficar em casa lendo um bom livro é um dos melhores programas em uma sexta à noite. Acredito que mudanças são inevitáveis, e que dar um passo a frente é a melhor opção. Acredito que chances não são ilimitadas. Acredito no trivial, na beleza dos dias comuns. E acredito principalmente que cada batida do relógio é réveillon.

Aos que amo, um feliz início. Seja no que for.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Agora, seja bem-vindo!


Entreguei uma carta de despejo para o inquilo do meu coração. Depois de alguns anos residindo confortavelmente e seguramente neste endereço fixo, decidi expulsá-lo de vez de dentro de mim. Foi um processo lento, mas consegui. No momento da despedida o cara de pau ainda teve a capacidade de perguntar-me se poderia, por um tempo, se instalar na minha mente. Isso para o caso de eu não ter tanta certeza quanto a minha decisão.

Gritei com ele por insistir.
Gritei comigo porque quase cedi.
E lembrei que o melhor nem sempre tem final feliz. Nós não tivemos.

Com o coração vazio resolvi limpar os cômodos. E não por acaso comecei pelas fibras musculares estriadas, afinal de conta são elas que se contraem sob a ação da vontade. Da vontade de voltar atrás. Depois segui para o miocárdio. No seu interior encontrei quatro coisas esquecidas pelo antigo morador. Ele havia deixado seu cheiro, seu gosto, o som do seu riso e estranhamente o que havia roubado de mim. Estava tudo lá. Esperando-me. Não foi fácil arregaçar as mangas e encaixotar tudo. Só separei o que de fato me pertencia. Por precaução lacrei as caixas e coloquei-as na calçada para não correr o risco de querer ficar com alguma quinquilharia, hoje, sem valor.

Quando voltei, já cansada, resolvi ver o estado do miocárdio. Já tinha esquecido como aquele espaço era grande, mas para minha surpresa ele estava revestido por um carpete. O que não me lembro de ter autorizado. Resolvi arrancá-lo, limpar por baixo. Acabei encontrando dores escondidas. Não resisti. Sentei e chorei. Eu já estava tão exausta, suada, desesperada. Parecia que aquilo nunca iria ter fim.

Fui até o jardim, estava pesado demais seguir naquilo tudo sozinha. Liguei para algumas amigas, e todas - como se tivessem combinado – aconselharam-me a prosseguir sozinha. Afinal, só eu mesma para colocar ordem naquele caos.

Regressei, varri, espanei, mas lá achei melhor esfregar o chão. Havia muita coisa grudada e remover algumas delas foi tarefa árdua. Lavei com água e um pouco de sabão em pó. Só então pude despejar desinfetante e esfregar para limpar o quer faltava. Ufa!!! Embora cansada já conseguia ver as coisas com outros olhos. O cheiro já estava diferente. Era bom acompanhar tudo que estava impregnado descer pelo ralo.

Segui finalmente para as quatros válvulas cardíacas. Onde inicialmente pensei que nunca chegaria. Molhei toda área e achei melhor usar detergente líquido no chão. Deixei 20 minutos de molho e em seguida joguei um pouco de alfazema. Dizem que limpa e purifica energeticamente o lugar.

Só depois de tudo limpo visitei todos os cômodos, um a um. Respirei fundo e me lembrei de como precisava daquele espaço limpo, fluindo energia, arejado para me sentir verdadeiramente bem e feliz. Quando estava na porta, pronta para sair, voltei ao miocárdio e peguei o que sempre me pertenceu: o brilho dos meus olhos. Mal cheguei a rua e ele já havia se espalhado e se reinstalado em mim. Inteira.